quinta-feira, 30 de março de 2023

Campeão



Contar histórias é algo que realmente considero interessante quando a história traz alguma lição de vida ou apresenta algum fato que venha a instigar a curiosidade humana de forma positiva.

Essa é a história do cachorro Campeão, um grande vira-lata de pelo escuro e olhos negros, cujo nome era forte e fazia jus ao seu comportamento. Quando ele nasceu, lhe deram um nome de cachorro destemido e valente.

Campeão era um cachorro pra lá de admirável, e jamais se recuava diante de um perigo ou de um desafio que a vida lhe apresentasse.

Engraçado, é que as pessoas costumam dizer que existe uma diferença muito grande na escolha dos nomes que os humanos dão a seus cachorros.

Dizem que as pessoas menos favorecidas financeiramente, costumam dar a seus cães, nomes tipo:

“Piaba”, “Lampreia”, “Campeão”, “Feroz”, “Malhado”, “Pop”, “Leão”, “Foguete”, “Batman”, “Rex”, “Bolinha”, “Farofa” etc.

Enquanto que, “os ricos”, aqueles que tem um pouco mais de grana, chamam seus cães de nomes "chiques", tipo:

“Zeus”, “Apolo”, “Boris”, “Charlie”, “Laika” “Molly”, e por aí segue a linha de nomes estilosos.

No entanto, cachorro é cachorro, e humano é humano, e no final das contas tanto faz a escolha do nome para o seu cachorro, porque chamando tal ou tal, eles serão adoráveis do mesmo jeito, e se mostrarão sempre fiéis e amáveis, colaboradores amigos que ajudam no crescimento humano, ensinando-lhes grandes lições de amor. Sim, porque o homem aprende muito com o cão, muito mais do que ele possa imaginar.

O cachorro tem uma amizade fiel, ele é leal e está sempre disposto, atento a tudo o que o seu dono faz, ele presta muita atenção na vida de seu cuidador. E seja qual for o perigo que seu cuidador venha a enfrentar, este nunca o abandonará.

Mas o Campeão aqui, o cão vira-lata, entra com a sua história de amor de cachorro, que vem nos apresentar uma ação em prol de um amor entre dois cães que viviam distantes um do outro.

Campeão morava na periferia da cidade quando se apaixonou por uma cadela de um bairro nobre. Ele viu essa cadela pela primeira num dia em que seu dono teve que leva-lo a um veterinário, porque ele havia pegado um bando de carrapatos gigantes no seu couro peludo. Nenhum remédio caseiro conseguia dar fim aos tais parasitas. Como o dono de Campeão não tinha dinheiro para pagar um táxi, aliás, até que tinha, mas quando se tem pouco dinheiro é necessário decidir as prioridades, como, e com o que gastá-lo, e seu Raimundo, dono do Campeão, tinha uma carrada de filhos para sustentar. Daí então surgiu a ideia de leva-lo até um veterinário conhecido, andando a pé mesmo pelas vielas da cidade.

Foi durante a volta do veterinário que, passando por uma rua arborizada localizada num bairro nobre, Campeão se deparou com uma linda cadela acocorada atrás das grades que protegiam uma casa de classe média.

Por traz do gradeado de ferro estava Lucky, uma cadela malhada, enorme, de pelo limpo e bonito. Lucky estava a contemplar o movimento da rua como faz todos os cães presos atrás das grades de suas casas, quando Campeão foi passando com o seu dono. Ela logo o notou, e ele também a percebeu de imediato! Foi amor à primeira vista canina! Campeão ficou vidrado na cadela. Seu Raimundo puxava a coleira, e ele não caminhava, foi necessário sair arrastando ele. Campeão queria mesmo era ficar e correr para o gradeado de ferro, para olhar de perto Lucky, com o seu porte de princesa, de deusa do universo canino.

Seu Raimundo começou a esbravejar com Campeão, pois já era hora do almoço e ainda havia muito o que caminhar até chegarem em casa:

_ Anda Campeão! Anda rapaz! Que coisa! Não emperra não, que eu não estou com paciência! Caminha! Não posso parar e esperar a sua boa vontade de caminhar! – dizia o dono do cachorro. Os dois estavam ainda muito longe de casa, seu Raimundo sentia fome e muito calor.

Sem muito senso de percepção, o dono de campeão não notara que ele estava enamorando-se de Lucky, a cadela da mansão. Com muito esforço conseguiu arrastar o cachorro para dar continuidade na caminhada de volta para casa. Até sumirem na esquina, Campeão olhava para trás sem parar, inquieto, queria mesmo era ficar contemplando Lucky.

Existe uma coisa muito interessante nos cães, eles farejam todo o caminho por onde andam, decoram os cenários, reconhecem o cheiro da estrada, e conseguem caminhar por distâncias enormes sozinhos, refazendo um caminho que os conduz a algum lugar importante para eles.

Já vi histórias de pessoas que se mudaram para bairros muito distante dos quais moravam outrora, e dias após a mudança, seus cães desapareciam da nova residência, e quando os procuravam, os encontravam em suas antigas residências.

Seguindo a lógica de que os cachorros são seres muito inteligentes e conseguem refazer sozinhos os caminhos distantes pelos quais já passaram em outros momentos, Campeão, no dia seguinte, levantou muito cedo e voltou ao mesmo lugar de onde havia visto os olhos de sua princesa Lucky. Como estava refazendo o trajeto do dia anterior sozinho, sem o seu dono, ele demorou bastante para chegar até a casa de Lucky.

De frente à casa da cadela Lucky havia um canteiro, onde colocaram uma boa quantidade de areia fina, própria para construção. Havia também uma fileira de árvores que proporcionavam sombras refrescantes ao local. Foi ali, naquela areia fina e fresca, debaixo da sombra de uma árvore, que Campeão se deitou para descansar de sua caminhada e esperar Lucky sair de dentro de casa e vir até o gradeado de ferro para ele cumprimenta-la e contemplar a sua atraente face canina.

Campeão estava ofegante ainda de sua longa caminhada, a língua quase a arrastar no chão, babas lhe escorriam sem parar dos cantos da boca, ele sentia muita sede. Não queria sair para procurar água e correr o risco de Lucky sair fora e ele não conseguir vê-la.

Não demorou muito e logo vem aquela deusa canina desfilando elegantemente a sua beleza malhada de cinza e preto pela passarela florida que ia do portão de grade até a varanda da casa. Ao vê-la, o coração de Campeão quase teve uma parada cardíaca. Ele não sabia o que fazer, não sabia se levantava e corria até a grade para se apresentar e cheirá-la, ou se, simplesmente contemplava a sua deusa à distância. Arregalou os olhos, parou de ofegar, a língua estabilizou-se e as presas nas laterais se tornaram visíveis, como se ele tivesse sorrindo de felicidade.

Quem via aquele cachorro do lado de fora olhando fixo para a cadela atrás do gradeado, não tinha nenhuma dúvida de que ele estava sorrindo, e estava muito apaixonado. Seus olhos brilhavam como dois lagos negros refletindo o luar. Uma luz emanava de seu coração deixando-o iluminado.

As horas se passavam e os dois apenas se olhavam a distância com olhares enamorados. Se fosse possível adivinhar os pensamentos de uma cão, certamente se descobriria que os cães também amam intensamente e se comunicam, fazem até declarações de amor!

Já quase ao pôr do sol, Campeão pegou o seu caminho de volta para casa, era necessário voltar. Ele era um cachorro responsável que nunca iria abandonar o seu dono. Havia também outro motivo que o forçava a voltar para casa – a fome! Não havia comido nada durante o dia.

Durante semanas Campeão desaparecia de casa pela manhã e só retornava ao pôr do sol. O caminho para o bairro de Lucky já lhe era muito familiar, e ele já não demorava tanto ao fazer o percurso. E de tanto caminhar, já estava mais resistente, fazia longos percursos correndo para chegar mais depressa e ver Lucky. Seu Raimundo só faltava enlouquecer procurando por ele todos os dias rodando pelo bairro inteiro e nada. Perguntava para os vizinhos mas ninguém sabia dizer nada sobre os sumiços de Campeão.

Não se sabe bem o que acontecera depois com o cão apaixonado, não se sabe dizer se houve um final feliz para a sua história de amor. Era a história do vira-lata que se apaixonou por uma cadela com pedigree, acostumada a ter tudo de que necessitava para viver.

Porém, é certo que uma coisa faltava para Campeão, que era viver o seu amor com Lucky. Ela o amava também, pois, sempre que ele aparecia diante das grades de sua casa, ela saia correndo na direção das grades, e ela sentia vontade de fugir daquela prisão e correr livre pela vida com o seu Campeão.

O amor nasce de um olhar em um momento de magia, não se deve deixar perder a magia de um grande amor, porque esse mágica não acontece sempre. Para alguns o amor nunca vem, por isso a importância de abraçar o amor, recebê-lo com ternura, aceitá-lo e vivê-lo com a intensidade que ele merece.

É preciso ser forte e corajoso o suficiente para não deixar o amor partir para sempre.


Rozilda Euzebio Costa

terça-feira, 28 de março de 2023

A Mulher do Texas

Ainda não eram nove horas da manhã quando o meu voo vindo de Palmas – TO pousara no aeroporto de Guarulhos. Mesmo sabendo que eu deveria passar um dia inteiro, uma noite inteira e a metade de outro dia esperando para embarcar no meu voo internacional, eu não me sentia assim tão desanimada. Ao contrário, estava até bem disposta para tanto tempo de espera, era melhor do que gastar do pouco dinheiro que dispunha para a viagem pagando diária de hotel. Eu conseguiria esperar naquele enorme aeroporto.

Se alguém é observador, estando nos aeroportos acaba notando muitas coisas legais e estranhas também. Eu não sou muito observadora, mas quando alguma coisa ou alguém me chama a atenção, acabo descobrindo particularidades interessantes.

Desta vez, ali sentada no saguão do aeroporto aguardando o tempo passar até chegar o dia seguinte, percebi uma senhora idosa, magra e aparentemente frágil, caminhando meio encurvada (devia ter uns setenta e poucos anos), entrar com um carrinho de aeroporto cheio de coisas. Nele havia uma mala, uma caixa de papelão, e uma caixa plástica de transporte animal, com um gatinho dentro. Portava em uma das mãos, outra caixa de transporte animal plástica com um cãozinho de olhar cabisbaixo. Ambos os animais pareciam estar acostumados com aquela condição. Temporariamente ou não, era ali dentro que eles estavam vivendo, em caixas de transporte animal.

Aquela mulher sentou bem próximo de onde eu estava e, abrindo umas latinhas, começou a alimentar o bichano e o cãozinho, dando a eles colheradas de ração. E os animais comiam bem, pareciam realmente acostumados àquela vida, sabe!

Passado algum tempo a mulher começou a conversar comigo, falava do seu voo para o Texas, que seria no dia seguinte às 17h. – Meu Deus! Fiquei ainda mais confusa – para o Texas?! Pensei comigo – o que ela vai fazer no Texas?! – não aguentei a curiosidade e perguntei por que ela iria para o Texas....

Ela então me disse que morava lá há muitos anos, numa zona rural, onde tinha uma fazenda. Falou também que vinha sempre a São Paulo porque tinha família nesta cidade. – Mas como? – pensei comigo – se ela tem parentes em São Paulo, porque não tem algum deles aqui lhe fazendo companhia?! - Eu não acreditei muito naquela história de ela morar no Texas, e questionei qual cidade do Texas ficava mais próxima desta “fazenda” onde ela vivia. Sabe o que aconteceu? Ela me desconversou, mudou de assunto, falou que o seu cãozinho era muito doce, e adorava a ração que ela dava para ele. Não respondeu a minha pergunta. Depois silenciou-se. Claro que achei muito estranho, ver aquela senhora com aqueles animais dentro do aeroporto. Até por que, os animais deveriam ser embarcados separadamente no voo... Bom, de qualquer forma, ainda faltava um dia e uma noite inteira para o embarque dela, daria tempo de ela embarcar seus animais – pensei.

Depois desta conversa fui dar uma volta pelo aeroporto, fui observar lojas, pessoas, e aviões pousando e decolando. Descobri que tenho paixão pela aviação, pena que só descobri isso agora, há pouco tempo, e já passei da idade de entrar numa escola de aviação. Mesmo assim me pego muitas vezes imaginando, como deve ser emocionante pilotar um Boing 737, ou mesmo, pilotar um daqueles A29 Super Tucano da Esquadrilha da Fumaça, fazer acrobacias no céu, deixar rastros e formas variadas com as fumaças coloridas... É fato que, descobrimos que gostamos de algumas coisas quando já é tarde demais para realiza-las. O gosto pela aviação é uma destas minhas descobertas.

O dia se passou tranquilo e sem muita novidade, demorou bastante para o sol se pôr, claro, pois quando se está vivendo uma espera, o tempo parece passar mais demoradamente do que o normal. Você olha várias vezes para o relógio e ele parece ter preguiça de mover seus ponteiros, tudo em torno parece estar se movendo mais lentamente.

Os quiosques começaram a fechar, e eu pensei – puxa vida, é meia noite! Graças a Deus! – então voltei para o lugar de antes, onde se faz o embarque dos voos internacionais. Eu percebi que a mulher do Texas ainda estava lá com os seus animais. Desta vez parecia estar cochilando, enquanto o seu gato e o seu cachorro também tiravam suas sonecas deitados dentro de suas caixinhas plásticas de transporte animal. Confesso que, olhando a fragilidade daquela senhora ali dormindo encurvada no banco, e mal posicionada, eu senti uma pena danada! É triste ver uma pessoa idosa vivendo uma situação de desconforto, porque todas as pessoas em sua velhice merecem viver uma vida confortável, pois a vida já é dura demais para quem tem a força da juventude, agora imagine para quem já está com idade avançada, quando todo o corpo sente o peso do tempo, e as pernas já não se sustentam mais como antes.

Após algumas horas acabei tirando um cochilo também, e quando acordei, já eram 5h da manhã. Havia mais movimento no saguão. Pessoas iam e viam empurrando os seus carrinhos, acho que, assim como eu, estavam ansiosas para embarcar o mais depressa possível. Ninguém gosta de esperar. A espera desalinha o nosso relógio biológico, ela promove uma lentidão dentro da mente enquanto os pensamentos sentem sede de movimento rápido. Peguei o meu carrinho com a minha mala e fui lavar o meu rosto amassado, e meus olhos fundos com olheiras, resultado da noite desconfortável que eu havia passado. Depois fui até a praça de alimentação para tomar um café. Eu precisava despertar a minha mente e o meu corpo, pois ainda teria a maior parte do dia para esperar até o momento do meu embarque.

Tomei o meu café, dei umas longas voltas pelo aeroporto, depois voltei a sentar no saguão de embarque do voo internacional. Aquela senhora ainda estava lá, da mesma forma que chegara no dia anterior. Desta vez, conversava com um passageiro que também esperava o seu voo. Ele, assim como eu, lhe perguntava para onde estava indo. De onde eu estava sentada, pude ouvir bem a conversa deles. O passageiro lhe instruíra a ir retirar a licença sanitária para o embarque de seus animais para o Texas (ela havia dito também a ele que estava embarcando para o Texas). E ela, seguindo suas instruções, saiu, portando seus animais com uma caixa em cada mão, e deixando seus pertences, dizendo que iria resolver isso. Pediu para que o passageiro, que só iria embarcar depois das 17h, vigiasse as coisas que estava deixando. Então, como ela havia dito que o voo dela decolaria às 17h, aquele passageiro se responsabilizou em ficar vigiando sua mala até que ela resolvesse o problema que tinha em mãos, o embarque de seus animais.

Demorou muito para que ela voltasse, e o passageiro descobrira, conversando com um dos seguranças do aeroporto, que aquela senhora, era uma moradora de rua, e tinha alguns problemas mentais também... Eu, que também ouvi o segurança revelando isso, fiquei com um semblante de espanto. – Que tristeza isso! – pensei – mas ela falava do seu Texas com tanta convicção que, em algum momento eu também acreditei que ela realmente estava indo para o Texas! Mas não, aquela senhora não tinha lar, ela vivia pelas ruas, becos, praças, rodoviárias e aeroportos, como tantos outros que vemos por ai, sem um lar. O que terá acontecido em sua juventude? –pensei – porque não existe ninguém por ela? Que escolhas ela teria feito em sua juventude que a levara a viver aquele resultado de vida? Talvez tenha vivido de sonhos impossíveis durante anos e anos de sua vida, enquanto sua idade foi se avançando, os anos foram se tornando pesados demais para ela realizar algum deles. Agora ela tinha apenas a companhia de seu cão e de seu gato...

Percebi na história daquela mulher um grau de imprudência consigo mesma em suas escolhas. Porque a vida não nos dá nada de graça, temos que construir o que queremos ter, que queremos vivenciar. Não dá para viver somente de sonhos e de esperanças, de projetos idealizados. É preciso escolher o terreno, levantar o alicerce, e construir os nossos sonhos enquanto temos a força da juventude a nosso favor. Porque depois disso, só nos restará um corpo cansado e uma mente frágil. É nessa hora que vamos precisar do conforto de um lar e do aconchego das amizades verdadeiras que construímos na vida. Digo isso, porque o acolhimento nem sempre vem da família, e sim, de quem verdadeiramente nos quer bem. Família é quem conquistamos. Quem nos quer bem. Quem abre os braços para nos aconchegar, nos fazendo sentir a nossa importância. Eu tenho visto muitas pessoas serem acolhidos por boas almas que não trazem nas veias o mesmo sangue. É como diz aquele ditado popular, “quem tem um amigo, tem um tesouro”. Não podemos ser ranzinzas com as pessoas, ser mal educados, ser fechados demais, pois isto nos afasta de todas elas. E entre estas pessoas que afastamos de nós com o nosso comportamento ranzinza, podem estar aquelas que teriam todo o gosto em cuidar de nós em nossa velhice e em nossas fragilidades. Aquela senhora do aeroporto não tinha nem mesmo um amigo para lhe dar um lar confortável, e para ajuda-la a tratar de sua saúde.

Quando saí para o meu embarque, a senhora do Texas já tinha voltado, mas ninguém ali a especulou mais sobre o seu embarque, porque todos já sabiam a verdade sobre ela. Uma coisa é certa, o Texas tinha alguma importância em sua história de vida. Alguma coisa que não tínhamos conhecimento estava na memória dela. Talvez um amor de juventude, uma grande paixão por alguém deste lugar. Ou mesmo, talvez o sonho de viver no Texas a tenha levado a memoriza-lo. Ou quem sabe, em sua juventude ela tenha assistido a muitos filmes famosos de Faroeste, daqueles filmados no Texas, e estas se tornaram suas melhores memórias dos anos passados. Talvez, agora, ela viva destas memórias.

Rozilda Euzebio Costa

domingo, 26 de março de 2023

Cortejando a mulher do próximo


Quando se é um jovem em transição da adolescência para a fase adulta, a prudência é apenas uma palavra contida no dicionário, cujo interesse em saber o seu real significado passa bem distante na lista de coisas importantes a serem aprendidas.

Tudo que um jovem deseja aprender está relacionado às descobertas prazerosas do mundo, e isso, claro, para um rapaz com o fogo nas calças, inclui conquistar o maior número de garotas possível, e ser considerado o conquistador do pedaço.

E quando se tem um pai que vê em seu filho o mesmo que ele fez, é motivo de preocupação ainda maior. Um jovem passando pela descoberta do sexo é algo muito sensível, e motivo de muitas preocupações paternas, pois é uma fase em que a prudência realmente passa bem distante de sua mente, aliás, nem faz parte de seu dicionário.

Neste conto é exposto a história de Ademar e Dilsinho, pai e filho, ambos muito semelhantes, além de se parecerem fisicamente, o pai se via em seu filho. A juventude de Ademar estava a se espelhar diante dele em seu filho Dilsinho.

Aquele dia tinha tudo para ser um dia comum, como qualquer outro na casa de Ademar, exceto pela discussão entre ele e seu filho Edilson, o Dilsinho pegador, como era chamado entre seus amigos da mesma faixa de idade. Levava a alcunha de, “Pegador”, porque não escapava nenhuma garota, sequer, de sua lábia, e de suas investidas.

Porém, dessa vez, a coisa foi muito mais além de uma simples conquista, e a discussão do pai com o filho não foi possível deixar de acontecer pela gravidade dos fatos.

Aquela chuva de palavras duras ouvidas de seu pai não foi apenas um alerta comum que um pai faz para o seu filho. Foi realmente um puxão de orelha daqueles bem duros e doídos, que martelou dentro do juízo. O motivo? o garoto estava “bulindo com a mulher do próximo”! E quem era o próximo? O leitor nem imagina! Quando eu digo que os jovens não tem nenhum pingo de juízo, eu não estou exagerando. O próximo neste conto aqui era o primo de primeiro grau de Dilsinho! O jovem estava bulindo com a mulher do seu primo, filho do irmão de seu pai.

A expressão “bulindo”, é uma forma bastante popular de dizer, mexendo, ou seja, cortejando.

Por sorte o jovem ainda não havia chegado às vias de fato com a mulher de seu primo, estava ainda na fase dos cortejos e investidas.

A mulher do primo também era muito nova, e não se tinha ideia de até quando ela iria resistir, porque o Dilsinho era boa pinta, um garoto bonito de pele morena, cabelos lisos, partidos para o lado direito, com algumas mechas caindo sobre os olhos.

Com o fogo da juventude quando na fase das descobertas, Dilsinho não deixava escapar uma garota, aquela que caísse em sua rede era peixe, e ele “traçava”, maneira de dizer que ele namorava mesmo.

O pai Ademar, estava sempre vigiando os passos do filho Dilsinho, mas às vezes ele conseguia fazer as coisas nas caladas da noite, e o pai não ficava sabendo. Dilsinho era motivo de muita preocupação para Ademar. O que mais lhe preocupava era o pensamento de que o filho caísse na tentação de ter casos com mulheres casadas. Já havia ouvido falar de muitos casos de conflitos por causa desses casos de jovens com mulheres casadas, inclusive sabia até de mortes de alguns homens porque buliram com mulher casada e os maridos descobriram.

O primo de Dilsinho, o Evaldo, esposo de Amanda, a personagem das confusões, estava a viajar naquele momento. Por sorte! E na discussão, Ademar esbravejava com Dilsinho dizendo:

_ Agradeça a Deus por seu primo estar viajando, senão você estava na merda. E eu, como seu pai, também estava mergulhado na sua merda seu inconsequente! Como que você vai bulir com a mulher do seu primo?! Você está louco? – o pai estava muito nervoso. No entanto, o filho se defendia e negava tais atos.

_ Quem contou isso pro senhor pai? Isso é mentira pai! É mentira! Eu nunca buli a mulher dele... O garoto foi interrompido pelo pai que estava extremamente nervoso.

_ Ah não? Deixa de ser cara de pau Dilsinho! Quem me contou não é de ficar espalhando mentiras, é uma pessoa muito séria! Não é mentira! Quem me contou ouviu você falando besteiras para ela, cantando ela! Meu Deus, eu fico só imaginando se o seu primo descobre isso! Você estará ferrado! Quando eu tinha a sua idade eu era mais prudente meu filho. E tem coisa que é falta de respeito sabia? Você está desrespeitando o lar do seu primo! – dizia o pai.

_ Tudo bem pai, eu admito que falei umas coisas para ela, mas o senhor não sabe da história direitinho... – Dilsinho foi interrompido pelo pai.

_ Ah não sei? E tem mais coisas?! Diz Dilsinho! – questionou surpreso.

_ A verdade pai, é que a mulher do Evaldo dá em cima de mim faz tempo ó! Não é de agora que eu me esquivo fugindo dela. Desde quando eles se casaram e vieram morar aqui no nosso bairro. Pai, ela já deu pra dois amigos meus, e não é mentira viu! Eles me contaram os detalhes disso. Eu sei que eu tenho as minhas culpas pai, mas o Evaldo não deu sorte com a mulher dele. Ela é uma desavergonhada pai. – disse o garoto.

_ O que que você está dizendo Dilsinho? Essa acusação é grave! – disse Ademar com ar de espanto.

_ É grave mesmo pai, e é a mais pura verdade. Se o senhor quiser eu provo.

_ Pobre do meu irmão Thiago! Que vergonha! – disse Ademar.

_ Pobre do Evaldo pai, com as galhadas o tempo todo na cabeça! O coitado tem que se abaixar pra passar nas portas. – respondeu Dilsinho.

_ Isso é coisa séria e você fica aí com brincadeira Dilsinho? – disse Ademar.

_ Não pai, eu não estou com brincadeira, é somente força de expressão. Mas ela trai ele sempre. Acho que ela não ama ele...

_ Isso não é da nossa conta Dilsinho.

_ Eu sei pai.

_ Mas isso também não justifica o seu erro Dilsinho, fica longe da Amanda está entendendo! Fica longe da Amanda, não me traga problemas pra nossa família entendeu? – alertou.

_ O senhor não vai contar pro tio Thiago, não é pai? – perguntou Dilsinho.

_ Por enquanto não. Mas vou observar esta história direitinho. Se eu comprovar que tudo isso que você está me dizendo é verdade, eu vou conversar com ele. Meu irmão precisa saber, até para evitar futuras confusões em família.

_ Pai, já que estamos falando sobre mim, tem uma coisa que eu quero falar pro senhor, porque é bom o senhor ficar sabendo. – disse o filho.

_ O que é? Tem mais problemas ainda? Tem mais coisas que não chegaram aos meus ouvidos Dilsinho? – perguntou o pai com assombro.

_ Tem pai. É muito grave também. Sabe o seu amigo e fornecedor de trigo, o Sr. Waterloo?

_ O que tem o Waterloo? – Ademar perguntou com ar de curiosidade.

_ Sabe a mulher dele?

_ A dona Raimunda?

_ Sim, a dona Raimunda pai.

_ Diz logo Dilsinho! Você está me deixando mais preocupado ainda! – disse o pai.

_ Então pai, ela vive me chamando pra sair com ela... – Dilsinho viu o pai arregalar os olhos com ar de assombro.

_ O Quêeeee! A dona Raimunda? Aquela senhora tão séria?! Você está inventando isso seu moleque! A dona Raimunda é uma senhora! Eu não quero saber de você mentindo e inventando as coisas pra mim não viu! – disse zangado.

_ Pai... – Ademar interrompeu.

_ Isso é muito, muito sério mesmo, imagina se... – Dilsinho interrompeu.

_ Pai, escuta pai, isso que eu estou falando pro senhor está acontecendo já há algum tempo! Eu é que me faço de desentendido e caio fora toda vez que ela vem com a história da gente ir pro motel.


_ Motel?! Eu estou mesmo é lascado! O meu filho envolvido até o pescoço em confusões com mulheres casadas. Primeiro descubro sobre a nora do meu irmão, agora, sobre a esposa do meu amigo e fornecedor de trigo! Aonde eu vou parar desse jeito? Meu Deus, que vergonha! – disse Ademar, decepcionado.

_ Pai, não é o senhor que tem que ter vergonha.

_ Cala a boca Dilsinho! Chega! Você, a partir de agora, vai andar bem longe da casa do seu primo Evaldo. E vai ficar muito longe também da dona Raimunda, entendeu? Me faça esse grande favor, não me arrume mais confusões. Ah meu Deus, minha cabeça vai explodir! Você tem ideia do que eu estou passando Dilsinho? – disse Ademar.

_ Desculpe pai, eu prometo pro senhor que nunca mais vou ser motivo de preocupação pra sua cabeça. Eu prometo pai. Mas já que estávamos falando da Amanda, eu achei melhor o senhor ficar sabendo também da dona Raimunda. – Dilsinho realmente falava sério.

Ademar agora tinha maiores preocupações para com o filho Edilson, o Dilsinho como era chamado. Mas foi melhor assim, ter uma conversa esclarecedora com o filho, pois sabendo o que o filho estava vivenciando, daria a ele maior clareza na forma de poder ajuda-lo a passar aquela fase de transição para a vida adulta e responsável.

Todo jovem, quando na fase da descoberta do amor e das sensações do corpo, passa por inúmeros desafios e conflitos, são desafios estes que, alcançam os pais e lhes tiram de sua zona de conforto. O importante é saber resolver os impasses com o diálogo, e com uma profunda investigação da verdade.

Os jovens são cercados de muitas curiosidades na descoberta do seu corpo e nas novas experiências e sensações. Muito do que eles vivenciam vem das influências externas, e até mesmo de uma exibição diante dos grupos de amigos dos quais fazem parte. Muitos jovens fazem coisas para provar que são donos de si, e que são capazes de fazer tais coisas. Eles não fazem porque desejam essas coisas, mas fazem porque alguém os desafiou a fazerem.

Acompanhar o desenvolvimento físico e psicológico dos filhos é uma obrigação dos pais, é uma ação que não pode ser transferida para a sociedade. É em casa, no seio familiar, que os pais precisam estar sempre dialogando com os filhos, esclarecendo as suas dúvidas, ouvindo-os com paciência e sem prevenção. Há pais que não deixam os filhos falarem de suas dúvidas e curiosidades, porque eles próprios trazem consigo muitos tabus, vividos e experimentados por eles mesmos na infância e adolescência com seus pais.

Se os pais não falam abertamente e de forma prudente com os filhos, a rua vai falar, e o pior, a rua vai falar da forma mais inadequada e perigosa possível, usando a linguagem da experiência real, causando-lhes dores, traumas, e trazendo-lhes imensos sofrimentos, os quais eles levarão suas marcas por toda a vida. Muitos jovens poderiam ter tido destinos diferentes, e terem tido uma vida mais feliz, se seus pais tivessem tido com eles, diálogos esclarecedores no seio familiar.


Rozilda Euzebio Costa




sábado, 25 de março de 2023

Eu pensei que você também me amasse (O homem vestido com a capa da fama)

Foi numa noite de abril que ele apareceu pela primeira vez nos sonhos daquela garota descuidada com os sentimentos, ela acreditava em qualquer lorota que alguém viesse lhe dizer. Flora era assim, uma garota realmente descuidada em relação aos seus sentimentos. Sempre se apaixonava pelo primeiro calhorda que lhe oferecesse uma flor murcha de um jardim abandonado em um terreno esquecido pelo dono. Flora era pura ingenuidade em sua maneira de ver a vida e as pessoas a sua volta, confiava em todo mundo, não via maldade ou desprezo em ninguém por ela, talvez porque acreditava que todos eram bons e sensíveis, pessoas do bem, etc.

No entanto, ele apareceu, aquele homem desvalido e frágil, necessitando socorro. Apareceu lá, no mundo dos sonhos de Flora, numa noite quente de abril, não sei se poderia chamar de sonho ou de fato, pesadelo, mas era muito nítido, claro e compreensível como um filme colorido. Ele estava rodeado de inimigos querendo destruí-lo pelas dívidas que ele havia feito com eles e não conseguia pagá-las! Eles o chutavam caído no chão, davam-lhe socos e o xingavam. Ela então, se vendo em sonho diante daquela cena horrível, não perdeu tempo, aproximou-se dos homens mercenários, questionou-os o motivo de estarem espancando aquele pobre homem no chão e eles lhe disseram gritando e cheios de ódio:

_Ele nos deve, tem que pagar ou nós vamos acabar com ele!

Flora enfiou a mão no bolso e nele havia muito dinheiro, ela pagou todos aqueles mercenários para que deixassem livre o pobre homem caído por terra. Ela o socorreu. Os mercenários foram todos embora, deixando em paz o homem.

Isso foi em um sonho de Flora naquela noite de abril! E sonhos, são acontecimentos incompreendidos, que ninguém nunca consegue desvendar completamente. Aliás, os sonhos são carregados de muitos mistérios e de cenas inexplicáveis.

O dia amanheceu e Flora recordou de tudo que havia vivenciado em sonhos na noite anterior. Ficou a pensar durante o dia, em tudo que havia visto. Recordava-se claramente da face do homem que ela havia socorrido nos sonhos.

Dias depois, Flora descobriu aquele homem nas imagens da internet ao procurar fotos para montar um trabalho. Ao abrir as imagens, lá estava aquele rosto que vira nos sonhos, mas não parecia um pobre coitado! Ela se deu conta de que o tal homem existia de verdade, e isso a confundiu ainda mais. Ele realmente existia, e não parecia aquele homem maltratado dos sonhos, que fizera o coração de Flora se sentir cheio de piedade e amor! Mas era o tal coitado dos sonhos, estava vestido com a capa brilhante e impiedosa da fama. Ela descobriu seu nome e várias outras fotos dele, sempre rodeado de outras pessoas também vestidas com o brilho do destaque daquela falsa importância a que as pessoas costumam atribuir a seres que escolhem a vida pública. Ele era na verdade, um homem vestido com a capa poderosa da fama, e isso fazia dele, um ser arrogante e narcisista, que escolhia viver somente entre pessoas também encapadas com as vestes da fama.

Porém, Flora não conseguiu ver o real monstro desumano que aquele homem era de verdade, ela só enxergou nele, aquele homem sofrido e necessitado de ajuda que lhe aparecera em seus sonhos naquela noite de abril. Oh, pobre mulher ingênua! Que acreditava que o amor não escolhia vestes! Mas o homem dos sonhos de Flora, sim, ele escolhia vestes e presenças, não era qualquer pessoa que poderia ser honrada de chegar perto dele, porque ele se achava um príncipe. Ele era aquele homem que também se enganava, porque acreditava que não fosse um homem comum, mas um príncipe, embora, a verdade fosse bem diferente, sem a capa da fama, ele realmente era apenas um simples homem como todos os outros homens desnudos de riqueza e poder.

Daquele dia da descoberta da identidade daquele ser vestido com a capa da fama que havia visto em seus sonhos, os pensamentos de Flora não tiveram mais paz, todos os dias e todas as noites pensava nele, apenas nele, vivia por ele, respirava por ele, e mais por ninguém. Parecia estar enfeitiçada por um feitiço realizado pelas bruxas malvadas de Avalon. Era assim que Flora se sentia, terrivelmente enfeitiçada por aquele homem com aparência de anjo e atitudes de um demônio. Ele era mesmo muito mal, desprezava as tentativas de Flora de conversar com ele, de se aproximar dele. A capa da fama que o homem vestia não deixava ninguém chegar perto dele se não tivesse algo grande para lhe oferecer em troca de sua atenção. O homem vestido de fama era orgulhoso demais, para receber em sua vida uma pobre mulher.

O tempo passava com todas as suas loucas estações, e nada de Flora conseguir se aproximar daquele homem. Mesmo se esforçando ao máximo, não conseguia se aproximar dele para provar a ele que o amava. Era esse pensamento que lhe passava pela cabeça, o de que tinha que provar ao tal insensível, que o amava.

Enquanto Flora sofria tentando se aproximar do homem vestido com a capa da fama, ele desdenhava o seu amor, escolhendo outras mulheres para a sua convivência e para provarem de seu amor.

Com o passar veloz dos anos, aquele homem se casou uma vez, depois outra vez, e a cada separação, Flora continuava esperando o dia que ele a percebesse e a amasse também, e assim, ela pudesse viver o seu conto de fadas com ele, casar-se com ele, e formar uma família, enfim, ser feliz ao lado daquele homem que ela acreditava ser o seu destino, o homem criado por Deus para ser o seu esposo. Olha que bobagem esse pensamento de Flora! Como era ingênua a pobre coitada! Passava pela sua cabecinha sonhadora que o tal homem da capa da fama iria gostar dela e também amá-la, assim como ela o amou desde que o viu naquele sonho que tivera nos anos já passados, ela realmente acreditava que o sonho era o sinal dos céus, mostrando a sua alma gêmea. Flora era uma mulher sem experiência nenhuma com os homens, era daquelas que acreditavam em príncipes e contos de fadas. Por isso, caiu no conto do sonho e iludira-se terrivelmente.

Flora perdera a conta de quantas mulheres haviam passado pelas mãos do homem da capa da fama, e ela sendo ignorada, sempre cada vez mais, ignorada, mesmo tentando se fazer notar por ele, construindo caminhos e pontes para o encontrar frente a frente.

Mas como tudo na vida precisa ter um fim, e toda criatura desperta para a verdade um dia, para Flora chegou esse dia também! Mais uma vez, aquele homem declarou o seu amor para outra mulher! E Flora, grandemente ferida e machucada, e sem forças para caminhar, arrastou-se por terra, tentando salvar o que ainda existia de vivo dentro dela, tentando não deixar apagar a vela de luz fraca que ainda estava acesa em seu coração. Afinal, o terceiro golpe que ela sofreu do homem com a capa da fama foi quase mortal, e ela teve que lutar para não desfalecer e deixar de existir completamente. Era necessário que ela salvasse o foco de luz que ainda permanecia aceso em seu coração. A vida não podia de forma alguma, acabar naquele instante para Flora, era preciso que ela buscasse suas últimas forças para salvar sua vida daquela terrível desilusão.

O homem com a capa da fama talvez não compreendesse que a fama é uma grande prostituta que se vende ao prazer, ela não dá nada a ninguém sem exigir o prazer e a alma do outro em troca. E quando o prazer acaba, ela desnuda a sua vítima, deixando-o no frio do abandono e o destruindo para sempre.

Somente o amor desinteressado e gratuito pode aquecer o frio existencial dos seres humanos. Tudo passa na vida e tudo é lição. Somente o amor desinteressado permanece na essência do homem que sobrevive às ilusões do mundo, se ele despertar a tempo de corrigir suas ações, e mudar a sua visão de felicidade.

Relacionamentos conquistados com a capa da fama não sobrevivem com as mudanças severas das estações, porque são sentimentos que nasceram do brilho de um glamour e da ilusão visual.

Quando alguém ama o outro em sua pobreza total, esse amor sustentará todas as bases da existência, alimentará a fome de sentimentos e cobrirá a nudez da alma, aquecendo-a nos dias frios e escassos de tudo.

O exemplo de Flora nos traz uma reflexão de que nem sempre os sonhos trazem coisas positivas para a nossa vida, o que se vê nos sonhos são metáforas e simbologias, necessitando de uma sabedoria de alma para interpretá-los e não se deixar enganar por eles. Interpretações vagas de sonhos podem acarretar em ilusões destruidoras e na desmotivação da mente na busca de coisas que valeriam a pena lutar por elas.

Ao se deixar levar pelo pobre homem desvalido sendo massacrado por mercenários em seu sonho, Flora deduziu que aquele homem era um bom homem, e após socorrer ele em seus sonhos, se apaixonou pela fragilidade dele, achou que ele era um sinal divino, mas era tudo uma metáfora, uma visão maligna para fazer com que ela transmitisse de sua boa energia para ele. E tão logo ela o descobrira na internet, a vampirização da energia dela começou a ser de fato real. O espírito daquele homem vestido com a capa da fama, com aparência de anjo e coração e mente de um demônio, passou a sugar a energia espiritual de Flora, deixando-a cada vez mais dependente da ilusão transmitida por ele e fragilizada. Falsos cenários e miragens constantes consumiam toda a energia de Flora, levando-a quase à morte. A vampirização da energia entre pessoas não acontece somente de forma presencial, há quem vampiriza a energia do outro também de forma espiritual. O vampirizador normalmente usa de artimanhas e enganos, para ter controle sobre a mente do outro e assim, sugar todas as suas energias, principalmente nos sonhos, onde tudo ocorre misteriosamente e sem o controle físico.

O cuidado com a interpretação dos sonhos e com o que os olhos veem é de extrema importância no livramento de males que podem acarretar na destruição das forças e dos objetivos de uma pessoa. Debaixo do sol, corre-se o risco de se envolver em enganos destrutivos.

Andar com os pés firmes, lutar sim, mas pelo que é tocável e que transmite de volta a luz que emanamos, que nos faz sentir que não estamos sozinhos no barco, que a pessoa a quem estamos dedicando nosso amor, também está remando junto, levando o barco para uma mesma direção.

Flora sobreviveu aos enganos que quase destruíram sua vida em relação ao homem vestido com a capa da fama. Quantas Floras existem por aí, se deixando enganar por homens vestidos de falsas capas, sejam elas, de fama, ou mesmo, capas falsas de bom moço? A felicidade não exige sacrifícios de vida e sangue, ela é o resultado de trocas de sentimentos saudáveis e verdadeiros.

Onde existe fama e poder, a realidade fica destorcida e obscura quanto aos sentimentos das pessoas.


Rozilda Euzebio Costa

sexta-feira, 24 de março de 2023

Estrada dos Talentos


Essa é a história de uma estrada conhecida por milhões de pessoas em todo o mundo e até fora dele, é a história da estrada que descobria os talentos das pessoas que passassem por ela.

Todos a chamavam de “Estrada dos Talentos”. Ela já era famosa por ter ajudado muitas pessoas a encontrarem o seu verdadeiro talento.

Um dia, um rapaz, bastante incrédulo, disse a seus amigos que iria fazer um desafio com a tal estrada:

_ Eu não tenho talento algum, e não sei fazer praticamente nada. Vou lá! Vou desafiar essa estrada e ver se ela é capaz de encontrar algum talento em mim. Vou caminhar por ela incansavelmente por dias e noites enquanto eu tiver força. Veremos se ela vai me dar algum talento.

E assim, aquele rapaz partiu em viagem para o lugar onde começava a tal estrada famosa. Ele tinha certeza de que nada iria acontecer, ele mesmo dizia que não tinha habilidade nem talento para fazer nada. Já tinha feito de tudo, mas não tinha descoberto seu talento.

O rapaz começou a caminhar, incrédulo e desconfiado, por aquela longa estrada. Ele olhava para à frente e ela lhe parecia uma estrada sem fim. Olhava para os lados, parecia bonita, com paisagens encantadoras. E foi caminhando, do nascer ao por do sol, e até por parte das noites de lua clara. Ele parava somente quando estava muito cansado.

O jovem rapaz caminhou por anos naquela estrada, até que um dia, avistou um galpão bem grande, e curioso, decidiu parar e entrar para ver o que tinha dentro.

Logo que entrou, os olhos do rapaz brilharam, ao ver dezenas de cavaletes com quadros brancos sem nenhuma pintura.

Abismado com a cena, o rapaz olhou para a sua direita e viu muitas cestas cheias de bisnagas de tintas de toda cor, e pequenos vasos repletos de pincéis de todo o tamanho.

As suas mãos começaram a se movimentar incontrolavelmente, e ele sentiu vontade de pintar aqueles quadros. Então começou a se lembrar de todos os belos cenários da Estrada dos Talentos por onde ele já havia passado. Pegou as bisnagas e os pincéis e começou a pintar cenários belos e coloridos nelas. Ali, naquele instante, ele descobrira que sabia pintar, então ficou emocionado e disse – é isso o que gosto de fazer! É o meu dom, o meu talento

O jovem se descobrira um grande pintor de quadros, era realmente o seu talento, que a Estrada dos Talentos lhe havia ajudado a descobrir.

Enquanto pintava os quadros, o jovem pensou novamente:

_ A história da Estrada dos Talentos é verdadeira!

Nesse instante um ancião lhe tocou o ombro, e ele se virou para ver quem era. O ancião olhando para ele, disse:

_ Parabéns filho! Você descobriu o seu talento trilhando a Estrada do Conhecimento!

O jovem então retrucou:

_ Não. Não senhor! A estrada por onde andei por anos, se chama “Estrada dos Talentos”!

E o ancião lhe respondeu:

_ É a mesma coisa, filho. Uma não existe sem a outra, as duas fazem parte de uma mesma experiência. Um talento não gera frutos sem conhecimento. Você descobriu o seu talento depois de absorver os aprendizados dados pelo conhecimento.

Aquele jovem se tornou um pintor muito famoso e aprendeu a lição da Estrada dos Talentos.


Rozilda Euzebio Costa
24/03/2023

quinta-feira, 23 de março de 2023

Naturaleza verde

 


Naturaleza verde, que fertiliza la fauna y la flora,
esencia de fuerza que nace de la tierra
que hace germinar las semillas,
creando árboles hermanas con brazos sensibles,
que cobijan a los pájaros y sus nidos,
que dan los frutos que alimentan otras vidas,
belleza no salvaje, pero casta, pura,
fortaleciendo animales, plantas, hombres y sus hijos.

Naturaleza fuerte, inspiración creativa de obras,
de gente de todos los colores,
y animales de todo tipo,
nacido en tierra, mar y aire,
variedad de formas y bellezas
alabanza de la magistral existencia divina,
que da a todos los seres el espíritu vivo,
sobre cuerpos hermosos y diferentes,
que en el mundo caminan, vuelan,
nadan y se arrastran.

Naturaleza de amor, sensibilidad y acogida,
llena de inspiración en sus creaciones,
artista de grandeza professional,
creando diversidade em toda la magnifica esfera del mundo,
compositora sensible de obras eternas,
que deja sus historias grabadas en el tiempo,
artes vivas que se mueven y también se multiplican,
naturaleza, poetisa escribiendo historias en la existencia,
de todo lo que habita el suelo sagrado de la Madre Tierra.


Rozilda Euzebio Costa

segunda-feira, 20 de março de 2023

Demonio en forma de ángel


Dulces palabras salen de tu boca en forma de canción
tus palabras cantadas son todas falsas,
son espinas arrojadas de tu lengua, sin emociones,
flecha felina y envenenada de tu odio disfrazado,
saliendo del arco de tu voz,
¡Qué contradicción!
Tal vez los dioses enfurecidos de Creta,
eran más piadosos y tenían más corazón.

Tristeza disfrazada de alegría y pasión, viene de las tus dulces melodías,
que salen de tu guitarra cómplice,
¡Oh inflexible bárbaro salvaje!
Te ves como un ángel,
pero tu mente es de un demonio,
eres cruel e insensible como los brujos de Plutón,
sólo piensas en tus conquistas y en tus placeres,
y hieres con tus flechas usando la crueldad,
quien en forma de sentimiento e bondad,
te ha ofrecido el pan del amor en tus días escasos.



Rozilda Euzebio Costa


domingo, 19 de março de 2023

Nací flor, nací Rosa



Nací una flor, para ser más preciso, una Rosa,
Era la primavera de septiembre,
sol, brisa suave y perfume en el aire,
Dios quiso que así fuera,
que llegasse entre otras flores,
que el sol de la mañana me diese fuerzas,
y que brillasse la llama de mi esencia.

Nací flor para ser amada por el amor,
para despertar a los pájaros y las mariposas,
para escribir sentimientos y canciones,
poetizar las olas del mar,
y amar todas las montañas bajo el sol.

Nací flor, nací Rosa.


Rozilda Euzebio Costa

Existe vida na leitura

 


Leio, para não morrer de fome de fantasia e de amor,

e para não mergulhar no pântano da solidão,
pois é lendo que me sinto em companhia,
que me vejo andando de mãos dadas
caminhando pelas folhas de um livro, acompanhada,
das personagens de uma história de ficção.

Leio, para encontrar qualquer sentimento que não seja em vão,
que me faça acreditar ao menos na ilusão,
do cavaleiro que chegará a qualquer momento,
quem sabe, no próximo verão.

Leio, porque ler me dá também inspiração,
me ajuda a esquecer de minhas mazelas,
me faz encontrar o caminho do sol,
seguindo os raios infiltrados nas folhas do limoeiro,
desenhado em uma ilustração,
ou na tonalidade de seu arrebol.


Rozilda Euzebio Costa, "Existe vida na leitura".

Aprendiz na dor

 

Nas minhas tristezas e decepções,
eu apanhei muito e cresci,
durante as tuas ausências,
eu sofri tanto e me feri,
mas também conheci outros caminhos,
e evoluí,
por entre os espinhos de tua indiferença,
eu chorava minha solidão,
minhas lágrimas caiam sobre solos,
e regavam dezenas de jardins,
e ainda os rego,
com minhas tempestades de tristezas,
mas até com elas eu também muito aprendi.

Enquanto meus rastros vão ficando para trás,
tua face também vai sendo apagada pelo tempo,
como fotografia antiga,
maltratada pelas horas passadas,
de cores vivas passam a esboços,
quase irreconhecíveis,
de momentos que um dia foram tão importantes,
agora se tornam memórias desgastadas,
pálidas,
vão morrendo nos ponteiros dos relógios,
já esbranquiçadas.

Rozilda Euzebio Costa, em "Aprendiz na dor."

Cinzas da vida

  Um homem de vida cinza e vazia, perdido em pensamentos que também estão cinzas, aqui estou eu na palidez da vida, olhando para esse tempo ...