Contar histórias é algo que realmente considero interessante quando a história traz alguma lição de vida ou apresenta algum fato que venha a instigar a curiosidade humana de forma positiva.
Essa é a história do cachorro Campeão, um grande vira-lata de pelo escuro e olhos negros, cujo nome era forte e fazia jus ao seu comportamento. Quando ele nasceu, lhe deram um nome de cachorro destemido e valente.
Campeão era um cachorro pra lá de admirável, e jamais se recuava diante de um perigo ou de um desafio que a vida lhe apresentasse.
Engraçado, é que as pessoas costumam dizer que existe uma diferença muito grande na escolha dos nomes que os humanos dão a seus cachorros.
Dizem que as pessoas menos favorecidas financeiramente, costumam dar a seus cães, nomes tipo:
“Piaba”, “Lampreia”, “Campeão”, “Feroz”, “Malhado”, “Pop”, “Leão”, “Foguete”, “Batman”, “Rex”, “Bolinha”, “Farofa” etc.
Enquanto que, “os ricos”, aqueles que tem um pouco mais de grana, chamam seus cães de nomes "chiques", tipo:
“Zeus”, “Apolo”, “Boris”, “Charlie”, “Laika” “Molly”, e por aí segue a linha de nomes estilosos.
No entanto, cachorro é cachorro, e humano é humano, e no final das contas tanto faz a escolha do nome para o seu cachorro, porque chamando tal ou tal, eles serão adoráveis do mesmo jeito, e se mostrarão sempre fiéis e amáveis, colaboradores amigos que ajudam no crescimento humano, ensinando-lhes grandes lições de amor. Sim, porque o homem aprende muito com o cão, muito mais do que ele possa imaginar.
O cachorro tem uma amizade fiel, ele é leal e está sempre disposto, atento a tudo o que o seu dono faz, ele presta muita atenção na vida de seu cuidador. E seja qual for o perigo que seu cuidador venha a enfrentar, este nunca o abandonará.
Mas o Campeão aqui, o cão vira-lata, entra com a sua história de amor de cachorro, que vem nos apresentar uma ação em prol de um amor entre dois cães que viviam distantes um do outro.
Campeão morava na periferia da cidade quando se apaixonou por uma cadela de um bairro nobre. Ele viu essa cadela pela primeira num dia em que seu dono teve que leva-lo a um veterinário, porque ele havia pegado um bando de carrapatos gigantes no seu couro peludo. Nenhum remédio caseiro conseguia dar fim aos tais parasitas. Como o dono de Campeão não tinha dinheiro para pagar um táxi, aliás, até que tinha, mas quando se tem pouco dinheiro é necessário decidir as prioridades, como, e com o que gastá-lo, e seu Raimundo, dono do Campeão, tinha uma carrada de filhos para sustentar. Daí então surgiu a ideia de leva-lo até um veterinário conhecido, andando a pé mesmo pelas vielas da cidade.
Foi durante a volta do veterinário que, passando por uma rua arborizada localizada num bairro nobre, Campeão se deparou com uma linda cadela acocorada atrás das grades que protegiam uma casa de classe média.
Por traz do gradeado de ferro estava Lucky, uma cadela malhada, enorme, de pelo limpo e bonito. Lucky estava a contemplar o movimento da rua como faz todos os cães presos atrás das grades de suas casas, quando Campeão foi passando com o seu dono. Ela logo o notou, e ele também a percebeu de imediato! Foi amor à primeira vista canina! Campeão ficou vidrado na cadela. Seu Raimundo puxava a coleira, e ele não caminhava, foi necessário sair arrastando ele. Campeão queria mesmo era ficar e correr para o gradeado de ferro, para olhar de perto Lucky, com o seu porte de princesa, de deusa do universo canino.
Seu Raimundo começou a esbravejar com Campeão, pois já era hora do almoço e ainda havia muito o que caminhar até chegarem em casa:
_ Anda Campeão! Anda rapaz! Que coisa! Não emperra não, que eu não estou com paciência! Caminha! Não posso parar e esperar a sua boa vontade de caminhar! – dizia o dono do cachorro. Os dois estavam ainda muito longe de casa, seu Raimundo sentia fome e muito calor.
Sem muito senso de percepção, o dono de campeão não notara que ele estava enamorando-se de Lucky, a cadela da mansão. Com muito esforço conseguiu arrastar o cachorro para dar continuidade na caminhada de volta para casa. Até sumirem na esquina, Campeão olhava para trás sem parar, inquieto, queria mesmo era ficar contemplando Lucky.
Existe uma coisa muito interessante nos cães, eles farejam todo o caminho por onde andam, decoram os cenários, reconhecem o cheiro da estrada, e conseguem caminhar por distâncias enormes sozinhos, refazendo um caminho que os conduz a algum lugar importante para eles.
Já vi histórias de pessoas que se mudaram para bairros muito distante dos quais moravam outrora, e dias após a mudança, seus cães desapareciam da nova residência, e quando os procuravam, os encontravam em suas antigas residências.
Seguindo a lógica de que os cachorros são seres muito inteligentes e conseguem refazer sozinhos os caminhos distantes pelos quais já passaram em outros momentos, Campeão, no dia seguinte, levantou muito cedo e voltou ao mesmo lugar de onde havia visto os olhos de sua princesa Lucky. Como estava refazendo o trajeto do dia anterior sozinho, sem o seu dono, ele demorou bastante para chegar até a casa de Lucky.
De frente à casa da cadela Lucky havia um canteiro, onde colocaram uma boa quantidade de areia fina, própria para construção. Havia também uma fileira de árvores que proporcionavam sombras refrescantes ao local. Foi ali, naquela areia fina e fresca, debaixo da sombra de uma árvore, que Campeão se deitou para descansar de sua caminhada e esperar Lucky sair de dentro de casa e vir até o gradeado de ferro para ele cumprimenta-la e contemplar a sua atraente face canina.
Campeão estava ofegante ainda de sua longa caminhada, a língua quase a arrastar no chão, babas lhe escorriam sem parar dos cantos da boca, ele sentia muita sede. Não queria sair para procurar água e correr o risco de Lucky sair fora e ele não conseguir vê-la.
Não demorou muito e logo vem aquela deusa canina desfilando elegantemente a sua beleza malhada de cinza e preto pela passarela florida que ia do portão de grade até a varanda da casa. Ao vê-la, o coração de Campeão quase teve uma parada cardíaca. Ele não sabia o que fazer, não sabia se levantava e corria até a grade para se apresentar e cheirá-la, ou se, simplesmente contemplava a sua deusa à distância. Arregalou os olhos, parou de ofegar, a língua estabilizou-se e as presas nas laterais se tornaram visíveis, como se ele tivesse sorrindo de felicidade.
Quem via aquele cachorro do lado de fora olhando fixo para a cadela atrás do gradeado, não tinha nenhuma dúvida de que ele estava sorrindo, e estava muito apaixonado. Seus olhos brilhavam como dois lagos negros refletindo o luar. Uma luz emanava de seu coração deixando-o iluminado.
As horas se passavam e os dois apenas se olhavam a distância com olhares enamorados. Se fosse possível adivinhar os pensamentos de uma cão, certamente se descobriria que os cães também amam intensamente e se comunicam, fazem até declarações de amor!
Já quase ao pôr do sol, Campeão pegou o seu caminho de volta para casa, era necessário voltar. Ele era um cachorro responsável que nunca iria abandonar o seu dono. Havia também outro motivo que o forçava a voltar para casa – a fome! Não havia comido nada durante o dia.
Durante semanas Campeão desaparecia de casa pela manhã e só retornava ao pôr do sol. O caminho para o bairro de Lucky já lhe era muito familiar, e ele já não demorava tanto ao fazer o percurso. E de tanto caminhar, já estava mais resistente, fazia longos percursos correndo para chegar mais depressa e ver Lucky. Seu Raimundo só faltava enlouquecer procurando por ele todos os dias rodando pelo bairro inteiro e nada. Perguntava para os vizinhos mas ninguém sabia dizer nada sobre os sumiços de Campeão.
Não se sabe bem o que acontecera depois com o cão apaixonado, não se sabe dizer se houve um final feliz para a sua história de amor. Era a história do vira-lata que se apaixonou por uma cadela com pedigree, acostumada a ter tudo de que necessitava para viver.
Porém, é certo que uma coisa faltava para Campeão, que era viver o seu amor com Lucky. Ela o amava também, pois, sempre que ele aparecia diante das grades de sua casa, ela saia correndo na direção das grades, e ela sentia vontade de fugir daquela prisão e correr livre pela vida com o seu Campeão.
O amor nasce de um olhar em um momento de magia, não se deve deixar perder a magia de um grande amor, porque esse mágica não acontece sempre. Para alguns o amor nunca vem, por isso a importância de abraçar o amor, recebê-lo com ternura, aceitá-lo e vivê-lo com a intensidade que ele merece.
É preciso ser forte e corajoso o suficiente para não deixar o amor partir para sempre.
Rozilda Euzebio Costa
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