sexta-feira, 15 de março de 2019

O homem que só se importava consigo mesmo


Olá! 

Meu nome é... Bom, o meu nome não importa. Eu tenho 50 anos de idade e moro sozinho em minha nobre mansão que fica de frente para um mar majestoso, exuberante e incrivelmente lindo. Suas águas são tão azuis que às vezes penso se não é o próprio céu que mudou de lugar. 
Sou o exemplo de um homem que dedicou a sua vida ao trabalho e aos prazeres do mundo. Um homem que buscou acima de qualquer coisa na vida, uma realização profissional e status diante da sociedade. Na verdade eu estou neste momento sozinho, sentado a meditar sobre o que realmente tem valor nesta vida. 

Durante muitos anos da minha vida me deliciei com o que o mundo me oferecia de prazer, tive muitas mulheres lindas e maravilhosas que diziam me amar, mas nunca fui fiel a nenhuma delas, e pra dizer a verdade eu brincava com os sentimentos delas, não me preocupava em saber se elas sofriam por minha causa, pelas malandragens que eu aprontava com elas. 

No entanto, o tempo passa, e a gente não percebe isso de imediato, não percebe que estamos envelhecendo, eu não percebia que estava envelhecendo e as minhas forças estavam se esgotando com o passar dos anos em minha vida. Só percebi isso quando notei que as belas garotas estavam se afastando de mim, os amigos das farras não me procuravam mais, e o espelho já não me era tão atraente quanto houvera sido outrora. 

Estou aqui sentado neste banco, como o um réu sendo julgado pela vida, sabendo já da minha sentença – a solidão e dores na minha consciência e por todo o corpo. 

Quem sabe talvez alguma boa alma passe por aqui e se importe comigo, me chame para conversar, e deseje ser meu amigo de verdade. Agora, mais do que nunca, eu desejo ter verdadeiros amigos. 

Na loucura e na correria do dia-a-dia, ninguém tem tempo para nada! Ninguém encontra tempo para as coisas que não dependem do dinheiro. E não foi diferente comigo. Além do mais, passei parte da minha vida correndo atrás de estabilidade financeira, acabei deixando para fazer amigos depois... Isso não tinha a menor importância para mim. 

Meses atrás descobri que estou gravemente doente. O meu médico me disse que estou com uma doença que não tem cura, que já está em estágio avançado, e me restam apenas alguns meses de vida. Isso caiu feito uma bomba na minha cabeça. E estou completamente sozinho sabe! 

Hoje pela manhã, olhando o mar vasto e exuberante no horizonte através da janela da minha mansão, pude observar o voo fascinante de duas gaivotas. Não consegui segurar as minhas lágrimas, e chorei... Chorei como uma criança. Chorei porque, mesmo com toda a fortuna que eu acumulei durante todos esses anos árduos de trabalho, eu não conseguirei realizar com esse dinheiro o sonho de ter a minha saúde restaurada, e nem uma companhia fiel, que me ame de verdade e se importe comigo, uma companhia que não me deixe ser devorado pela silêncio e pela solidão. 

Estou me sentindo abandonado e inútil, sou como um grão de areia no deserto sendo levado pelos ventos fortes da vida. 

É muito difícil enfrentar uma solidão, e ainda estando doente. Saber que não terei ninguém para me dar apoio neste momento, não construí verdadeiras amizades, não construí uma vida plena de amor e companhias leais. Os “amigos” que eu tive antes de ficar velho e doente eram amigos do meu dinheiro, do meu status. Foram-se todos embora. Chega a doer no fundo de minha alma quando penso que dei valor a pessoas que nunca mereceram a minha amizade. 

Às vezes até invento alguma coisa para me distrair. Jogo um jogo de paciência no computador, assisto a um bom filme. 

Sabe que, muitas vezes passei na porta das igrejas mas nunca desejei entrar nelas, mas atualmente entro nelas e participo das celebrações. É o único lugar em que me sinto valorizado e acolhido, logo eu que nunca tive interesse nas coisas que se referem a religiões, agora é o único lugar que realmente encontro companhia para conversar e ter um pouco de alento. 

Outro dia o sacerdote me elogiou, disse que eu sou um homem de bem, que devo agradecer a Deus por estar passando por tantos sofrimentos, porque, como diz ele, “estou purgando os meus pecados”, e isso quer dizer que não levarei para a “vida eterna”, uma alma carregada de excessos de pecados. 

As minhas empresas eu nem sei mais como andam. Elas estão todas nas mãos de administradores que contratei, porque não tenho mais disposição física e mental para cuidar delas. Eu já não tenho mais ânimo para nada... 

Penso em como seria diferente se eu tivesse dado mais atenção às pessoas que me queriam bem, se tivesse respeitado o sentimento das pessoas que realmente me amaram... 

Eu sei que, no fundo, fui eu mesmo o verdadeiro culpado pela sina que me envolve. Com a minha fixação em construir o meu patrimônio e de aproveitar as delícias da vida, eu não tive tempo para mais nada, e para ninguém. Eu julgava importante apenas as pessoas e coisas que me proporcionavam algum tipo de prazer. 

Quase atropelei o próprio tempo, corri contra ele durante a maior parte da minha vida numa corrida desenfreada e sem propósito justo e de valor para a minha vida. 

Se eu pudesse voltar ao passado eu mudaria tanta coisa em minha vida! Tanta coisa! Mudaria os meus valores e viveria apenas um dia de cada vez, sem atropelar o ritmo natural das coisas para construir um patrimônio que hoje, ao olhar para ele eu percebo que não possui nenhum sentido que tenha valido a pena eu perder a minha saúde por ele. 

Desculpe por eu tomar o seu tempo com os meus problemas. Mas é que, eu desejo deixar registrado a minha história de vida, para que outras pessoas não venham a passar pelas mesmas coisas que eu estou passando. 

Um abraço fraterno. 

Eu, o homem que só se importava consigo mesmo 



Rozilda Euzebio Costa

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